O PEVE (processo extraordinário de viabilização de empresas), mais parece uma bazuca a dar tiros de pressão de ar.
É nos momentos de perturbação que precisamos de grandes medidas.
O problema desta lei é que remenda joelheiras, numas calças, com pano podre.
Quase ninguém vai ficar satisfeito, mas ficou bonita.
Quando vamos ao hospital entramos pela triagem.
Foi inventada na I Guerra Mundial, quando os médicos franceses confessaram não ter meios suficientes para salvar todos os feridos.
Assim, dividiram-nos em três grupos: os com probabilidade de viver, com tratamento, os que, a atenção médica imediata poderia influenciar o prognóstico e os sem probabilidade de viver. Isso exigia uma avaliação criteriosa e sistemática.
O PEVE deixa logo a empresas nas mãos do administrador judicial provisório.
Nas últimas décadas as leis estão privatizando a Justiça: agentes de execução, para penhoras, mediadores de recuperação de empresa para o RERE, fiduciários para as exonerações do passivo das pessoas insolventes e os administradores judiciais para as insolvências, PERs e agora o provisório para o PEVE.
Se nalguns casos concordo, como no mediador, em que tenta auxiliar as partes, já no resto o cidadão comum ficaria melhor servido com uma Justiça não privatizada. Sou a favor da privatização de quase tudo, menos da Justiça.
Por exemplo: O devedor e o credor ficam a lidar com uma pessoa que não tem a “autoritas” dum Juiz.
Um Juiz é uma entidade abstrata, os demais não.
Ninguém pergunta o nome do Juiz.
Mas todos perguntam o do administrador judicial.
Não podemos ir a casa uma pessoa que não é o Estado.
Ele vive numa casa particular, mas diz-nos que agora lhe temos que prestar contas.
E há os desaparecimentos de fundos…
Francamente, não vejo qual a vantagem em não ser o Estado a fazer tudo isto, com estas pessoas, em locais próprios.
A taxa de sucesso numa execução encarece uma justiça já caríssima. É o Estado a dizer que não é competente e isso preocupa.
Não prepararam o PEVE totalmente para salvar as empresas?
O PEVE aplica-se a empresas, empresários e entidades que não banca, seguros ou empresas públicas, que se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente ou atual.
Mas só referente aos que estão assim em virtude do COVID19 e que ainda sejam susceptível de viabilização e que demonstrem ter, em 31/12/2019, um activo superior ao passivo.
Só para as micro ou pequena empresa é que o passivo pode ser superior ao activo àquela data, mas apenas se não estiverem em PER, insolvência ou especial para acordo de pagamento, e:
• ou tenham recebido um auxílio de emergência no âmbito do quadro temporário relativo a medidas de auxílio estatal e o mesmo não tenha sido reembolsado nos termos legais,
• ou estejam abrangidas por um plano de reestruturação das medidas de auxílio estatal.
Mas, se não fosse o Covid19 algumas poderiam recuperar.
E lembra-se da triagem? O administrador provisório terá essa função. Fazer uma de 3 escolhas:
1. empresas que se podem salvar, se se agir rápido,
2. as que com tratamento se vão salvar
3. e as que estão moribundas e devem insolver.
Manter as moribundas provocará mais sofrimento, o melhor é optar pela eutanásia.
Mas às que são viáveis o caminho foi errado.
A medicação vai matar algumas delas: aquelas que com uma medicação adequada se curariam.
Ao entrarem no PEVE vão tornar públicas as suas dificuldades e alguns fornecedores perdem a confiança.
É como tornar pública a leucemia do treinador, mesmo esta doença tendo cura. A economia vive de expectativas.
A solução correcta teria sido uma triagem criteriosa e sistemática prévia e a escolha para as mais viáveis de uma similitude com o RERE e similitude com o PER para as menos.
Para aquelas os mediadores e o processo secreto, salvo credores envolvidos.
Para as últimas os administradores.
Mesmo a questão dos postos de trabalho ficou deficitário na lei.
A solução criativa seria um processo para propor moratórias fornecedores, banca e trabalhadores.
Não digo fazer como 2020 não tivesse acontecido.
Mas criar um processo que permitisse aos devedores aflitos pedir ao tribunal de comércio respectivo que lhe mediasse renegociar prazos de pagamentos.
Um engripado precisa de uma convalescença, mesmo que seja em teletrabalho.
Não se pode andar na rua ao frio e à chuva.
A criação de um processo exclusivo para negociar moratórias, períodos de carência, quando possível, em que estivesse, por exemplo, um mediador e que convocasse credores e devedor, sem a quantidade de papelada que o PEVE exige, evitava a insolvência de milhares de restaurantes, lojas de rua, pequenos negócios e médios negócios do turismo.
Irá haver revisões ao PEVE, mas sendo o Covid19 o terramoto de 2020… falta um Marquês que faça a triagem e salve as empresas feridas e enterre as mortas.